Vinte de março de
2020. Pelos últimos dois dias protelei, mas saí de casa.
Desconfiada, coração angustiado. A sensação era uma só: medo.
No supermercado,
controle de entrada de pessoas para evitar aglomerações. Senhoras
mascaradas empurravam o carrinho lotado. O olhar era de apreensão,
olhar de canto de olho. Os movimentos eram de apreensão. Todos
evitando uns aos outros. Apesar de saudável, me senti ameaça. E
também ameaçada.
Lavar as mãos, álcool
gel, lavar as mãos, álcool gel. Assim saí de um mercado para outro
menor, onde encontrei uma pessoa querida, que me disse ainda não ter
beijado a filha depois que ela voltou de viagem. Pela primeira vez
senti vontade de chorar. Estamos, de fato, em um momento de
privações.
Nesses dias tenho
lembrado muito de minha mãe. Lá no início da década de 1990, um
surto de cólera explodiu no Brasil. Minha mãe, educadora e
assistente social, levava informações para crianças em escolas,
inclusive na que eu estudava. Vi diversas vezes ela explicando que
poderíamos evitar a doença com gestos bem simples, como lavar as
mãos e os alimentos que fôssemos consumir.
Nunca esqueci.
Impressionada, como sempre fui, fazia várias vezes o teste da pele
que ajudava a identificar uma pessoa com cólera. Como o doente perde
muita água, a pele fica sem a elasticidade natural. Minha
preocupação não tinha qualquer sentido, mas existia pelo medo.
Mesmo assim, não me lembro de perceber tanto medo como consigo ver
hoje nos olhos das pessoas.
Tenho percebido pessoas
abaladas psicologicamente e isso me preocupa bastante, tanto quanto o
aumento da pandemia. Estamos vivenciando uma situação em que não
sabemos muito bem o que fazer nem tampouco o que será no futuro. Não
conseguimos lidar com prazos. Não temos respostas e as certezas são
poucas. Eu fiz uma escolha para esses dias em que me isolo
socialmente: tentar manter tanto minha saúde física quanto a saúde
mental. Não me alienar, mas evitar os excessos. E me colocar à
disposição de quem não está conseguindo, seja para conversar
sobre o assunto, ou desviar o foco, falar amenidades, sugerir músicas
e filmes, o que seja. Sou toda ouvidos.
Vejo muita gente
questionando nas redes sociais o que as pessoas mais gostariam de
fazer quando terminar o isolamento social. Eu só quero poder sair
sem sentir esse medo tão palpável que vivenciei quando fui ao
supermercado. Quero poder estar entre pessoas que amo, sem me sentir
um perigo.
Suas palavras exterioriza o sentimentos de muitos inclusive o meu... obg por está sempre disponível e acessível.
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