Não costumo falar
muito. De mim, em especial, vou guardando coisas até não caber
mais. O silêncio se acumula até transbordar, fazendo doer as
costas, fazendo pesar o mundo. Engolimos o desaforo, os abusos, as
dores e chega um momento em que precisamos nos perguntar: para onde
está indo tudo isso?
Há alguns anos
passei por momentos muito difíceis, porque tudo isso se transformou
em algo maior. Coração acelerado, o corpo trêmulo sem conseguir
controlar. Tinha medo, muito medo, de tudo. Tinha medo de morrer e
várias vezes fui parar na emergência do hospital porque tinha
certeza de que estava tendo um ataque cardíaco. Tinha certeza que
morria naquele instante. Sentia frio, vontade de chorar e não
entendia quando faziam exames e exames e me diziam: está tudo bem.
Como estava tudo
bem? Claro que não estava! Procurei ajuda e ouvi o diagnóstico
apressado de um médico que me rotulava. Apressado mesmo, sequer
cinco minutos de avaliação e ganhei um rótulo. Essa mesma pressa
que nos faz engasgar no dia a dia, que nos faz acreditar que estamos
em uma corrida contra o tempo, contra as estatísticas, contra nós
mesmos, contra a vida. Corremos tanto… pra que? Pra onde?
Passei muito tempo
vivendo esse medo constante. Sentia medo de sentir o medo que me
paralisava ou me fazia correr pro hospital na certeza da morte. Mas
tive ao meu lado mãos que me seguravam, que me impediam de cair de
vez, que me davam força pra acreditar que o medo ia embora. Ele
sempre ia. Tive essa sorte, muitas pessoas não têm. Muitas pessoas
até têm, mas mesmo assim não conseguem.
Tentei fugir dos
rótulos, das dores engavetadas, do torpor do remédio que fazia
sumir as sensações ruins e as boas também. Tentei acreditar que
somos muito mais que compartimentos, onde cada lugar é para uma
coisa. Não é assim. Não é pra ser assim. E quando eu consegui
respirar sem tanto peso, sem tanta culpa, sem tanta cobrança,
prometi a mim mesma que falaria sobre isso, que tentaria dar a mão a
outras pessoas para que elas não passassem o que eu passei.
Mas eu nunca
consegui fazer isso. Poucas pessoas sabem realmente o que eu passei.
Em algumas situações consegui ver olhares desesperados, como que
pedisse ajuda. E tudo que consegui foi dizer que tudo ficaria bem,
que não valia a pena aquela dor que cultivamos sem nem nos dar
conta. Às vezes é tudo o que queremos ouvir, que alguém realmente
se importa, sem qualquer juízo de valor.
Resolvi escrever
sobre isso por causa do momento em que estamos passando. Pelas
incertezas que se tornaram crescentes, pelos discursos que tenho
ouvido de que se você não faz é porque não quer. Se você não
chega é porque não é capaz. Se você não vence é porque é
fraco. Esse discurso é perverso, é a mesma ideia apressada que quer
rotular e nos colocar nas caixinhas.
Precisamos falar
mais sobre nós, como nos sentimos. Isso não é tabu, não é
errado, é necessário. Precisamos nos escutar. Precisamos enxergar o
outro e estender a mão.